Em construção.
Em construção.
Em construção.
O Fanatismo era um bebê e foi deixado na porta da casa de uma família. Esse bebê tinha graves problemas de audição e visão. A família que morava na casa onde ele foi deixado era formada por dona Verdade, o senhor Justiça e a filha deles, Sabedoria. Ele foi acolhido com amor e sempre foi bem cuidado.
No entanto, à medida que crescia, devido aos seus problemas de visão e audição, começou a ter dificuldades com seus pais adotivos. O Fanatismo passou a achar que a Verdade não era tão verdadeira como deveria ser e que o senhor Justiça também não era tão justo como deveria ser. A Sabedoria tentou ajudá-lo, explicando que sua percepção estava distorcida porque ele não conseguia ver e ouvir direito a Verdade e a Justiça. Mas o Fanatismo também não ouvia a Sabedoria.
Um dia, insatisfeito e revoltado, o Fanatismo abandonou definitivamente a Verdade, Justiça e Sabedoria. Saiu de casa decidido a construir um lugar melhor, onde pudesse levar a verdade e fazer justiça do jeito que ele entendia que elas deviam ser.
O Fanatismo percorreu o mundo e chegou a uma região onde havia duas cidades vizinhas: uma se chamava Inocência e a outra, Consciência. Ele escolheu morar entre os inocentes que habitavam a cidade de Inocência. Nessa cidade, havia um rei que resolvia e decidia tudo sempre de um jeito bom, mas sem a necessidade de escrever leis. O nome desse rei era Bom Senso.
A ausência de leis na cidade de Inocência incomodava muito o Fanatismo. Ele convenceu os inocentes de que precisavam eleger um ministro para assessorar o rei e elaborar leis. Realizou-se uma eleição e, como era de se esperar, o Fanatismo foi escolhido como primeiro-ministro. A escolha aconteceu porque o Fanatismo falava muito alto, com muita convicção e por impulso de afetos exagerados, e isso era muito diferente do Bom Senso que sempre falava de forma tão amena e moderada e preferia pensar de forma calma e sóbria sobre as coisas sem se afetar por emoções momentâneas. Essa diferença no modo de falar primeiro impactou os inocentes e depois os fez acreditar que precisavam do Fanatismo para lhes dar segurança e representá-los.
Os inocentes, sempre que ouviam o Fanatismo, se impressionavam com o que ele gritava, mas não refletiam sobre as consequências do que era dito. Como primeiro-ministro, o Fanatismo, começou a escrever leis incessantemente. Havia regras para tudo, e muitos habitantes de Inocência começaram a se sentir incomodados. Porém, a essa altura, o Fanatismo já havia conquistado muitos seguidores, que ele adulava e dava poder, e que, por sua vez, o exaltavam e protegiam com fervor. Por causa desta diferença entre os que aceitavam e os que rejeitavam o Fanatismo, houve uma divisão entre os cidadãos inocentes, até amigos, irmãos e também pais e filhos se voltaram uns contra os outros.
Com o tempo, o Fanatismo passou a criar leis que obrigavam todos a pensar, falar e agir exatamente como ele. Muitos inocentes não suportavam suas imposições. O rei Bom Senso, ao ver o sofrimento de seu povo, tentou deter o Fanatismo. Mas já era tarde: o Fanatismo tinha crescido muito entre os inocentes. Foi então que aconteceu um golpe. O Fanatismo tomou o poder e mandou matar o Bom Senso.
Agora rei, o Fanatismo impôs regras rígidas para tudo e estabeleceu vigilância sobre todos. Nada, absolutamente nada, poderia ser diferente do que ele determinava. O gosto pessoal de cada cidadão – o modo de vestir, a música que escutava, as aulas que frequentava, a religião que professava, o time para o qual torcia, até a maneira de falar e gesticular – tudo era rigorosamente imposto.
Na cidade vizinha, Consciência, reinava Clareza. A rainha Clareza governava com leis escritas, mas sabia considerar as exceções da lei muito bem e com o tempo as aprimorava e por isso muitos reconheciam em Clareza um parentesco com Bom Senso. Com o golpe e o governo absolutista do Fanatismo, alguns inocentes foram obrigados a passar para Consciência.
Os inocentes que chegavam à Consciência voltavam para sua cidade natal no esforço de fazer as coisas melhorarem por lá. Um deles, certa vez, disse a o Fanatismo que a lei tinha sido feita para os humanos e não os humanos para a lei. O Fanatismo ficou perturbado com aquelas palavras e mandou matar quem disse isso.
Outro que voltou da Consciência escreveu um livro cujo ensinamento final era que a letra mata e o espírito vivifica. O Fanatismo achou reprovável essa afirmação, mandou queimar os livros onde isso estava escrito e matar quem escreveu. Essas ideias pareciam dar espaço para pensar coisas diferentes e até para mudar as leis que o Fanatismo havia escrito. E para o Fanatismo as coisas tinham que ser como sempre foram, ele não gostava de mudanças e coisas novas. E a ideia de mudar a lei era como uma ofensa direta para o Fanatismo que as tinha criado, pois isso era como dizer que ele estava errado. E para o Fanatismo mesmo ele nunca estava errado. O Fanatismo jamais desconfiava de que podia estar errado e não aceitava quem quer que fosse que sugerisse isso.
Enfim, outro homem disse que aqueles que conheciam a verdade e não a declaravam e que usavam a lei para impedir a realização do bem, eram como cães que se deitam no cocho dos bois e que não comem e nem deixam comer. O Fanatismo achou isso perigoso, Então, mandou matar mais uma vez e criou meios de censura para que ninguém mais começasse a falar tais baboseiras. O caso ficou tão grave que tudo parecia suspeito e perigoso para o Fanatismo, como em uma paranoia. Mesmo os inocentes que passaram para o lado do Fanatismo e que por ele tinham sido adulados e cooptados, foram traídos e pagaram um preço terrível sendo perseguidos ou mortos. No fim, todo aquele que ficava muito perto do Fanatismo ou que dele queria se afastar era perseguido.
Um muro, então, foi erguido pelo Fanatismo para que os inocentes não pudessem mais passar para a Consciência. E o Fanatismo reina até hoje entre muitos inocentes, com apoio de outros que não são inocentes. Existem aqueles que o consideram muito bom, outros desconfiam dele. Mas, para que o Fanatismo se mantenha reinando é preciso executar os inocentes que chegam na Consciência e também impedir que outros tentem lá chegar.
Um dia os cães despertaram e começaram a falar. Sim, um dia isso aconteceu, mas eles não ficaram acordados, apesar de continuarem falando. Logo os cães fizeram suas cidades, criaram suas leis, sua religião, suas famílias e tradição. Heráclito nasceu em uma destas cidades chamada Éfeso. Quando era um filhotinho ainda, Heráclito chamava a atenção, ele era grande e tinha porte e por isso era maltratado pelos coleguinhas que sabiam que ele nunca revidava. A diretora não ajudava muito, pois ela apenas rosnava e dizia que o problema era com ele que era tão esquisito. De fato Heráclito era esquisito ele falava coisas que os outros não entendiam, mas não era culpa dele... o que acontecia é que ele também via coisas que os outros não viam. Quando ficou mais crescidinho, Heráclito começou a notar como os outros cães eram previsíveis. As reações dos cães eram sempre as mesmas de acordo com os estímulos que tinham. Quando um cão rosnava pro outro, o outro não conversava, simplesmente rosnava de volta e muitas vezes mordiam um ao outro. Isso era especialmente verdade quando os cães estavam no trânsito dirigindo seus carros. Entediado, Heráclito começou a reagir sempre de uma forma diferente do que sabia que era o esperado e por isso sua situação piorou. Foi nessa altura que a mãe de Heráclito decidiu mandar ele ao psicólogo. Do psicólogo foi ao psiquiatra e logo tomava ritalina.
Heráclito quando adulto, por conta própria deixou de tomar remédios, apesar de continuar fazendo terapia. Parecia mesmo que ele estava bem enquadrado entre os outros cães. Heráclito casou-se e empregou-se em uma empresa respeitável e tudo parecia seguir o curso normal. Mas, as reflexões de Heráclito nunca o deixaram. Na vida adulta ficou mais claro para Heráclito que os cães haviam aprendido a falar, mas que nunca haviam deixado sua vida canina instintiva e primitiva. Heráclito percebia que o dom da fala, os costumes e as criações das artes e da filosofia expressavam um impressionante poder de transcender a animalidade canina, mas que apesar disso cada cão vivia no adestramento do cotidiano uma outra doma que obedecia a mesma mecânica cega dos instintos. Agora os cães já não caçavam e se refestelavam com a devoração da presa, no lugar disso eles batiam o ponto todo o dia no trabalho e se refestelavam com um salário minguado no quinto dia útil de cada mês. Eles não corriam mais atrás do próprio rabo, mas corriam para a televisão, para o shopping, para o consumo e Heráclito entendia que isso apenas significava que o rabo tinha mudado de lugar. Ao ver os cães andando na rua com o celular na frente do focinho, tinha certeza que o rabo estava na frente da cara e que isso era tão alienado quanto ficar dando voltas sem sair do lugar. Os cães também tinham suas eleições e Heráclito via aí um exercício maravilhoso da cidadania e de tudo que os fazia cães conscientes. Infelizmente, Heráclito via que na prática o candidato mais bem preparado nunca era eleito. Na verdade os cães votavam sempre no cão que latia mais, ou que latia como eles mesmos queriam latir. E não importava muito se o candidato tinha mesmo condições de fazer o que prometia, mas se ele falasse em dar mais ração ou que iria fazer da ração mais saborosa, era neste candidato que todos votavam. Sim, os cães falavam e pensavam, mas mesmo fazendo isso, se não fizessem o resultado seria o mesmo. Heráclito tinha descoberto que os cães dispunham da razão, mas ao invés de fazer o animal servir a razão, era a razão que servia aos apetites do animal.
Apesar de tudo isso, tudo estava bem porque Heráclito não andava mais falando dessas coisas. Porém, não teve jeito, parecia que Heráclito também tinha um instinto, o instinto de falar e ele não conseguia deter mais isso. Na verdade Heráclito tinha os mesmos instintos dos outros cães, mas ele não se envergonhava deles e não os transformava em violência mascarada em palavras. Heráclito gostava de correr na grama e sentir seu coração bater com força. Ele também gostava de sentir o vento na sua língua que ficava pendurada pra fora quando ele corria. Quando os outros cães viam isso eles ficavam escandalizados e detestavam que Heráclito existisse. O que acontecia na verdade é que Heráclito tinha coragem de fazer o que todos eles queriam, mas a vergonha os impedia de fazer. Perturbados, os outros cães só viam uma saída, deter Heráclito o quanto antes pra não terem que encarar, não ele, mas o que tinham dentro de si mesmos. Contudo, o principal instinto de Heráclito era falar e como ele não podia parar isso, um dia começou a falar...
Um dia Heráclito falou com o juiz e perguntou por que as leis favoreciam quem tinha poder econômico e político e desfavorecia os pobres e os que não tinham prestígio. Heráclito chegou mesmo a questionar se as leis deveriam ser mudadas. Questionou ainda se quando as leis não mudam não deveria a população dos cães se organizar, se levantar e mudar o sistema. Era muito mais subversão social do que o cão juiz podia aguentar. O cão juiz latiu pra ele e disse que o problema não eram as leis, nem a sociedade, mas o próprio Heráclito que era esquisito e perigoso. Outro dia Heráclito foi falar com um professor e perguntou por que a escola ensinava tanta coisa complicada e inútil e não ensinava os cães a pensarem por si mesmos, a votarem melhor e enxergarem os próprios erros causados pela alienação e pela animalidade instintiva. O cão professor se zangou e latiu para Heráclito e disse que o problema não era o sistema de educação e sim Heráclito que era esquisito e analfabeto. Heráclito foi ainda falar com o sacerdote da igreja, o cão pastor. Heráclito disse ao cão pastor que não podia entender a visão dos outros cães sobre Deus e a religião. Heráclito não conseguia entender Deus da mesma forma que os outros porque todos os cães entendiam Ele como um Cão grande que comandava o universo. Era inaceitável para Heráclito que Deus fosse um cão que no tédio de não ter uma bolinha pra correr atrás decidiu criar o universo pra se entreter. Ele também não entendia por que a religião só fazia os cães se sentirem culpados e pecadores, quando o fundo dela era o amor e o amor alegra a vida. O cão pastor enfureceu-se e latiu para Heráclito e disse que ele era um ímpio, um ateu, um lunático e coisas piores. Heráclito também falou com seu terapeuta e perguntou à ele como podia saber se quando falava sobre os problemas de Heráclito não estava falando de seus próprios problemas. Ele também perguntou se quando o terapeuta dizia que Heráclito era a causa dos seus próprios problemas não era um modo de esconder o fato de que o terapeuta não tinha nenhuma resposta que pudesse ajudar de verdade Heráclito. Heráclito chegou a comentar se era possível que não houvesse nenhum problema com ele e que dizer pra ele que tinha problemas poderia ser um modo de garantir o salário de terapeuta. E adivinha?! Pois é! O cão terapeuta ficou pinel! Latiu muito! E depois de muito mostrar os dentes, finalmente o cão terapeuta terminou a sessão, disse que Heráclito deveria voltar a tomar remédios e que o preço da sessão tinha dobrado o valor.
Heráclito largou a terapia. Heráclito tinha certeza que havia algo de errado com o mundo. Mas, apesar do que disse ao terapeuta ele não ignorava que ele também tinha um problema. O que acontecia é que Heráclito tinha um problema, mas não queria esconder isso. O abrigo da hipocrisia e da falsidade servia para muitos ou quase todos, mas não para Heráclito e por isso ele pagou um preço. Depois de algum tempo falando, Heráclito passou a ter mordidas como respostas. Ninguém queria se aproximar de Heráclito e quando se aproximavam era apenas pra dizer que ele era esquisito, que não entendiam ele, talvez ele devesse falar como todos falavam, pensar como todos pensavam... Heráclito foi chamado de obscuro.
Heráclito finalmente se cansou de ser mordido, de ouvir latidos, de viver no grande canil entre os cães. E o que fazer? Viver na hostilidade do convívio de seus pares, afastar-se e ficar só para sempre? Enfim, Heráclito já não corria na grama com a língua pra fora. Heráclito evitava o convívio com os outros cães e mantinha-se só em sua casinha, às vezes distante até da família. Terminou ficando doente e todos disseram que ele só estava doente por causa dele mesmo.
-Abusa da paciência de todo mundo, fala heresias, perturba a ordem pública ... dá nisso! O grande Cão lá de cima castiga!
Heráclito morreu. Ao fechar os olhos, Heráclito ficou feliz, viu um canil diferente e ninguém latia ou mordia ele.
Heráclito teve em vida um amigo. Heráclito dizia desse amigo que ele era o “doido dos doidos”, pois era doido como o Heráclito mesmo era, mas se esforçava pra ser normal. Esse amigo encontrou com a esposa de Heráclito muitos cadernos com escritos dele. E por ser, talvez o único que entendia Heráclito, viu que tudo aquilo era importante e que não podia se perder. E porque o amigo queria ser normal e falava como cães normais ele conseguiu mostrar o valor dos escritos para um editor que publicou “Fragmentos Completos de Heráclito, o obscuro”. Puxa... o nome causava efeito. Todos se impressionaram com o nome e muita gente importante começou a ler o livro. E por causa disso ler o tal livro ficou “chique”. Heráclito ficou famoso depois de morto, virou celebridade e passou a ser amado. Mas não foi só ele que virou celebridade. Todos que conheceram Heráclito também viraram celebridades depois que ele morreu e seu livro foi publicado. Eles foram entrevistados e mesmo depois de terem latido uma vida inteira para Heráclito só falaram bem dele depois da sua morte. Todos falavam como se fossem amigos íntimos de Heráclito. Os conhecidos de Heráclito também escreveram livros. O juiz escreveu “Direitos caninos e a emancipação dos cães segundo Heráclito”. O professor escreveu “Heráclito e uma nova escola para um novo cão”. O Cão pastor escreveu “Reviver na fé, Heráclito na Cabana”. E o terapeuta escreveu “Heráclito e os sete hábitos de um cão altamente eficaz”.
Todos os apontados na história ganharam dinheiro e ficaram muito felizes, mesmo não tendo acordado. E todos que liam os livros de Heráclito que eram cheios de palavras de despertar, também só repetiam as palavras, mas não despertavam. Mas, pra que acordar quando se pode ser um cão falante, saudável e sociável que tem celular, uma poltrona confortável e uma TV de tela plana? E caso seja um cão estressado que late pra os outros no trânsito... bem... procure o cão juiz certo, frequente a igreja do cão pastor, eduque-se melhor com o cão professor e vá ao cão terapeuta... ele poderá te ajudar!
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Antes de entrar, respire fundo. Babilógos não é um livro, é um lugar. Um lugar feito de palavra, sonho, ruína e renascimento. Não se lê Babilógos — nela se passeia. Como quem caminha entre ruas de frases e janelas de metáforas, como quem se surpreende ao virar cada esquina de um poema.
Aqui, os prédios são construídos com sílabas, as praças florescem com versos e as estátuas sussurram ideias antigas. Nesta cidade labiríntica, quem guia o visitante é Daquipralix Voltarindo — bobo, filósofo, palhaço e profeta — que, com um sorriso sutil e olhos de quem já viu demais, nos apresenta os becos e palácios dessa Babilônia da linguagem.
O leitor será desafiado a rir da dor, a pensar com o coração, a lembrar o que nunca viveu. Haverá travessias místicas e mercados mundanos, loucuras que parecem razão e silêncios que gritam mais do que a palavra. Não há roteiro fixo. Cada leitor criará sua própria cidade a partir da mesma planta — e encontrará nela o que estiver pronto para ver.
Você, leitor, não é apenas convidado. Você é peça essencial dessa engrenagem sem lógica aparente, mas com coerência poética. Sem sua leitura, Babilógos não existe. Então venha. Abra o livro como quem abre um portão. Daquipralix já o espera com um chapéu de três pontas e um mapa sem coordenadas. Siga.
Babilógos não se limita à reunião de poemas ou à construção de uma narrativa alegórica. Trata-se de um projeto literário híbrido, que tensiona os limites entre poesia, filosofia, psicanálise e teatro simbólico. A cidade de Babilógos, aqui apresentada como espaço ficcional, não é apenas o pano de fundo, mas sim um protagonista conceitual: um território constituído pela palavra e pela memória, onde os signos ganham agência e os significados se metamorfoseiam a cada leitura.
Inspirado por tradições simbólicas que vão da mística alquímica à tragicidade grega, passando pela sátira e pelo existencialismo moderno, Christyan Brenner propõe um itinerário espiritual e estético. O leitor é convidado a assumir a posição de viandante, guiado por Daquipralix Voltarindo — figura que evoca o trickster, o bobo filosófico e o bufão iniciático — em uma travessia que se dá tanto no plano narrativo quanto no subjetivo.
Babilógos se edifica como cidade-linguagem, onde a polis se dá pela polissemia e a arquitetura é semântica. Seus bairros, edifícios e ruínas são capítulos temáticos que operam como estações psíquicas e culturais. A cidade, construída por um Rei sem Nome que domina a arte da palavra viva, é também uma alegoria da criação literária, da potência demiúrgica da linguagem e de seus limites diante do indizível.
Nesse contexto, a obra não pode ser compreendida a partir de uma leitura linear ou unívoca. Há um forte investimento na multiplicidade de sentidos, na reflexividade metalinguística e na provocação estética. A forma híbrida — que articula textos poéticos, narrativas mitopoéticas, comentários performáticos e imagens — reforça a polissemia e sublinha a proposta de um universo literário totalizante.
Esta análise, portanto, não tem a pretensão de preparar o leitor para a travessia, mas sim de adverti-lo: Babilógos é um convite ao extravio, à dissolução das categorias estáveis do saber e da leitura. Aqui, cada verso pode ser uma rua sem saída ou uma passagem secreta; cada imagem, uma alegoria ou um espelho. Em tempos de esvaziamento da palavra, este livro propõe — ousadamente — a sua reencantação.
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Breve resumo da história:
"A Pedra da Saudade e o Jardim de Aurora" narra a jornada de Peregrino, que carrega em seu peito uma pesada Pedra do Luto. Ele experimenta as diversas facetas da dor – da negação à raiva, da negociação à tristeza profunda e sempre buscando por um alívio. Peregrino descobre que o luto se manifesta de muitas formas, e que não há um jeito "certo" de sentir a própria pedra. Sua jornada o leva ao encontro de Aurora no Jardim da Memória, onde aprende que o luto não se cura, mas se transforma. Lá, ele é guiado a regar com suas lágrimas e a usar a poeira dourada da saudade para plantar flores, transformando a dor em amor e memória. O livro também oferece um "Mapa para o Apoio", ensinando como ser um porto seguro para quem vive a perda, evitando as "pedras vazias" (frases feitas comumente ditas diante do luto) que não ajudam. Ao final, Peregrino compreende que o luto é o nome que se dá ao amor que não tem para onde ir, e que ao chegar com sua pedra na aceitação, ela se transforma em um medalhão que ele carrega no coração, uma parte de si, e não mais um fardo.
Uma fábula para transformar a dor em flores
“A Pedra da Saudade e o Jardim de Aurora” é um daqueles livros que chegam como um abraço silencioso em tempos de perda. Escrito em forma de fábula, ele nos convida a acompanhar a jornada de Peregrino, personagem que carrega no peito a “pedra do luto” — pesada, fria ou incandescente, símbolo do vazio deixado pela ausência de quem se ama.
Ao longo da narrativa, essa pedra se transforma: ora raiva, ora negociação, ora tristeza profunda. Mas também vai revelando possibilidades de acolhimento e ressignificação. Ao conhecer Aurora, uma senhora sábia e luminosa, Peregrino descobre que o luto não é algo a ser escondido ou superado, mas cuidado, regado e transformado em memória viva.
A metáfora do Jardim da Memória é especialmente poderosa: nele, as lágrimas irrigam lembranças, e da poeira dourada que a pedra solta nascem flores — símbolos de amor que permanece. Há ainda um Mapa para o Apoio, lembrando que, diante da dor do outro, o mais importante não é oferecer frases prontas, mas sim presença, escuta e gestos de cuidado.
Este livro não é apenas sobre luto; é sobre amor em sua forma mais persistente. Ao final, a pedra de Peregrino não desaparece, mas se transforma em medalhão brilhante, carregado com leveza e sentido.
Com uma escrita poética e acessível, o livro oferece um texto que pode ser lido por adultos, jovens ou até em rodas de conversa sobre a vida, a morte e a saudade. É um livro que conforta, guia e inspira, mostrando que a ausência pode florescer em memória e que a dor, quando acolhida, se transforma em amor.